domingo, 22 de novembro de 2015

Vivendo a "mágica da arrumação"



A mágica da arrumação, de Marie Kondo, é um daqueles livros cuja leitura não é o suficiente para nos sentirmos satisfeitos - fazer uma resenha literária também não é, tampouco. Por isso, a minha resenha não é sobre ler o livro, mas sobre vivenciá-lo.

Para quem anda meio afastado da gigantesca pilha de best-seller na entrada de qualquer livraria pop ou de franquias de drogarias que se disseminam como a peste, explico: é um novo sucesso que você encontra ao lado de edições como The Fault In Our Stars e 50 Tons de Cinza.

[Falo o nome em inglês do livro porque achei o sentido bem mais interessante do que o da tradução "A Culpa É Das Estrelas".]

O livro foi escrito por uma japonesa profissional em arrumação e que aplica o método KonMari (por ela inventado) em seus clientes; ele consiste em algumas regras que precisam ser seguidas a risco e prometem, ao final, mudar não apenas sua casa - seu lar, seu templo, seu supra-sumo da segurança e do conforto -, mas sua vida, tipo, para sempre. Seu modo de ver o mundo, seu modo de se ver no mundo, suas vontades, suas realizações. Tudo muda.

Projeto ambicioso, não?

Tentador, eu diria, se você, como eu, for uma pessoa bagunceira - mas responsável e autocrítica -, que sempre viveu um equilíbrio dinâmico entre a ordem e o caos e já reservou diversos sábados ou domingos para arrumar o guarda-roupa, ou a estante de livros, ou a escrivaninha; que sempre criou métodos de organização que provavelmente não funcionam - ou não repetiria sazonalmente o ritual de arrumação quase compulsivamente.

Admitamos que criatividade na arrumação não é o que falta a nós, caóticos ordeiros, mas, por alguma razão, a bagunça volta; ela vai e volta até você aprender a se conformar com a entropia da vida e ficar concordando com aquelas listas de sites alternativos que apregoam idéias como "pessoas bagunceiras são mais criativas". A gente quer acreditar.


Ralph Morse—Time & Life Pictures
Escritório de Einstein. Vai que, de bagunça em bagunça, a gente se descabela e bota a língua para o mundo no final.

De fato, havia alguma ordem em minha bagunça. Por exemplo, se eu largasse meu pente em um determinado setor da casa, a exatamente vinte centímetros da parede e com uma inclinação de 45º para leste, eu me lembraria tranquilamente onde e como havia deixado. E isso servia para tudo. Mas era chato, dava uma sensação de sufocamento, como se eu usasse somente pertences visíveis e esquecesse o que estava escondido; além disso, era trabalhoso, como se o processador funcionasse a 100% para executar funções que deveriam demandar apenas 10% de seu cérebro. E sempre corremos o risco de alguém mudar as coisas de lugar sem se importar muito - ninguém nunca entende que uma bagunça pode ser sistematizada e acaba mudando de lugar o que não é para ser mudado - porque pensa que você, bagunceiro-mor, não se incomodará.

A verdade é que, no fundo, eu estava insatisfeita e tinha a vaga sensação de que os ambientes usados por mim continham mais pertences meus do que o necessário; nunca fui de ter muita tranqueira, mas já era excessivo para mim.

Então, por impulso ou intuição, comprei o livro. Ele é bem fácil de ler - em menos de um dia já dá para acabar -, arregacei as mangas e fui praticar os sagrados ensinamentos orientais de perpetuação axiomática. Aproveitei um feriado para fazê-lo.

Primeiro, peguei uma folha e escrevi em uma lauda por que havia decidido organizar minhas coisas. Isso foi importante porque eu relia tudo o que havia escrito ao longo dos cinco dias de arrumação e entendia de forma completa e organizada que era aquilo mesmo que queria fazer, ordenava os pensamentos e evitava a auto-sabotagem. Eu não estava a passeio - era um compromisso.

Na realidade, faz parte do método KonMari uma proposta minimalista de vida; a idéia é manter em nosso Templo do Supremo Descanso somente aquilo que nos faz bem, que nos traz alegria, que nos edifica. Entendamos: vivemos em uma sociedade sedentária e consumista. Para se acumular coisas desnecessárias, não é preciso muito esforço. Conheço gente que não é consumista, que é super desencanada e desapegada e que, mesmo assim, acumula coisas por puro descaso - simplesmente porque se importa tão pouco que vai deixando acumular e não faz o menor esforço para se livrar daquilo. E, ao mesmo tempo, quando precisa de algo, não tem - porque não se importa e acha que tem pertences suficientes, sendo que nada do que possui lhe está sendo realmente útil.

Vivemos bem a sociedade líquida do Bauman, formada por pessoas com valores líquidos em vez de sólidos e que olham o mundo com os olhos do consumo: consumir com os olhos, consumir com as mãos, apossar-se, esperar eternamente o próximo entretenimento a ser consumido, como um recém-nascido novidadeiro que relanceia os olhos pelo ambiente à procura de estímulos desconhecidos que possam diverti-lo.

Hoje, produtos são feitos em série, por isso se tornaram mais baratos e descartáveis; vivemos um consumo que nunca houve e nossa produção de lixo é gigante. Acho que natureza, ao contrário de nós, não tem nada contra o lixo, mas se, nós temos algo contra, temos de diminuí-lo, não é? A proposta do KonMari também abrange isso. A idéia, nesse quesito, é:

- Primeiro, selecionando o que fica, temos uma noção melhor do que temos e evitamos comprar um produto repetido; por exemplo, vai que você compra dentifrício simplesmente porque não lembra onde guardou os outros; com o KonMari, você diminui a quantidade de coisas e ainda escolhe um ambiente para guardar tudo o que pertencer ao mesmo grupo.

- Além disso, você passa a conhecer melhor seu estilo de vida. Você sai do olhar consumista e desejante e fortalece um olhar crítico sobre o que você realmente faz e usa, por isso fica um estilo de vida definido. Nada de comprar por impulso!

E mais: praticar o desapego com coisas em casa traz uma reflexão sobre o que mais você tem retido na vida por puro apego. Que medo de perder é esse?

O primeiro passo para uma arrumação eficaz é selecionar, portanto, o que fica e descartar o que não serve mais. Assim, aumentamos o espaço disponível para armazenamento e simplificamos o processo de definir locais fixos para os pertences.

Enquanto escrevia o motivo de eu querer aplicar o KonMari, mentalizei que, além de procurar alguma tranquilidade/praticidade, precisava também sentir prazer nos resultados que o método traria. Para isso, mentalizei três momentos:


  • Quando entro em uma loja de móveis, vejo cômodos inteiros montados no mostruário - quartos, escritórios, banheiros, salas, e acho maravilhoso aquele minimalismo todo; cômodo de loja é cômodo sem cacareco, tudo parece mais prática, mais fácil;
  • Quando me hospedo em um quarto de hotel, tenho a mesma sensação de limpeza e praticidade; surpreendo-me como hotéis contêm estritamente o necessário e sem nossos cacarecos. Lojas e hotéis são locais impessoais, eu sei, mas servem de inspiração em qualidade de vida; em vez de sentirmos essa leveza nesses ambientes apenas, podemos transportar esse conforto para nossa própria casa;
  • Quando Clary Fray conhece, em Cidade dos Ossos, os quartos de Jace e Isabelle Lightwood, nós nos deparamos com o contraste de personalidade entre os irmãos adotivos. Isabelle é uma diva escandalosamente linda, sensual e excelente guerreira; seu quarto reflete a intensidade de suas emoções: é todo preto, dourado, prateado, com montanhas de roupas baphônicas até o teto e um banheiro turquesa parecido com um camarim de luxo. Já o Jace é obcecado com ordem e limpeza, possui um quarto amplo e limpo, e seus bens materiais consistem apenas em uma minúscula pilha de roupas e uma restrita coleção de livros. Em um determinado momento tenso da história [SPOILER ALERT], ele precisa fazer as malas e partir do Instituto - daí ele coloca seus bens sobre a cama e, enquanto a narrativa fazia o leitor se sentir comovido com aquele momento triste injusto, eu fiquei "nooooossa, quero ser assim um dia, reunir tudo o que tenho em cima de uma cama". Imaginar o quarto de Isabelle me deixava sufocada; já o de Jace era uma maravilha.
  • Quando me mudei de casa (fiz isso muitas vezes na vida), houve aquele momento de encarar várias caixas misteriosas com meu nome escrito na casa nova; então, começava a desembrulhar as coisas para guardá-las. No começo, ficava aliviada por encontrar livrinhos, roupas, computador - itens do dia-a-dia - mas, no final, havia caixas e caixas de que cacarecos dos quais nem me lembrava mais, e aí me perguntava "preciso mesmo guardar isso?". Dava uma vontade selvagem de jogar no lixo tudo o que desembrulhava após a quarta caixa.


Botei essas observações no papel. Na outra página, fiz a sequência de coisas que organizaria. O método é assim: você reúne coisas por categoria, e não por cômodos; escolha um lugar, como a cama ou a mesa (ou o chão de casa japonesa), reúna tudo que pertencer a uma mesma categoria, espante-se com a quantidade que você possui e selecione o que fica e o que vai embora. Tem que ser assim; se for por cômodo, você corre o risco de ter itens de uma mesma categoria em cômodos diferentes e a bagunça fica diluída, nunca organizada. As roupas precisam ser reúnidas de uma vez - limpas, sujas, amarrotadas, emprestadas; o mesmo vale para livros, documentos, tudo.

A ordem das categorias também tem uma regra: começa-se por roupas, que é o grupo mais fácil de se descartar, e avança-se gradualmente até a categoria de bens únicos de valor imaterial - como fotografias e memórias. Segui à risca as categorias KonMari: roupas, livros, documentos, itens variados, bens de valor único. À medida que escrevia as categorias KonMari, repassei mentalmente os meus pertences para ter uma noção de quais tinha. É muito importante organizar essa etapa e de fato reunir tudo o que você possui de cada categoria porque, se esquecer um item na hora de separar, ele será sumariamente descartado depois, sem possibilidade de "julgamento". O motivo é simples: não há sentido em manter algo do qual você nem se lembrou na hora certa.

Comecei pelas roupas. Kondo ensina a reunir todos os pertences e a tocar cada um deles individualmente, para que criem vida em nossas mãos e compreendamos se há alguma ligação, se há algum futuro com aquilo. A relação com a matéria é de respeito e gratidão, uma completa noção de sua utilidade e da alegria que ela nos dá, sem essa mistura de soberba e culpa que prevalece em nossa cultura. Comecei por roupas de inverno (já que estamos na primavera) e, à medida que a pilha de descarte aumentava, fui me animando. 

Kondo fala que devemos segurar as coisas e perguntar: "isso nos dá alegria?" Acho muito fofo, mas é algo que eu, no alto do meu racionalismo, não consigo sentir com facilidade - mas captei bem a idéia. No meu caso, o que sentia era o seguinte: havia coisas que, quando eu segurava, eu simplesmente aprovava sumariamente, como se não houvesse uma barreira entre mim e a coisa: funcionávamos. Porém, com outros itens, eu hesitava, como se houvesse alguma dificuldade entre nós. Exemplos: "nossa, essa calça é linda e usei várias vezes, mas me aperta mais do que eu gostaria"; "a camiseta é confortável, uso sempre, mas não fica bonita como gostaria"; "isto é lindo, sempre elogiam quando coloco, mas não é meu estilo, me sinto esquisita"; "fica bonito, mas, por alguma razão, nunca consegui usar"; "a cor é linda, o tecido também, é confortável, mas essa gola é meio estranha, não fica totalmente ok". O momento de hesitação é o de descarte. Então, mesmo que o que você sinta em relação aos seus bens não seja "alegria", você perceberá que não terá dúvidas em relação a algumas coisas e terá dúvidas com outras.

Há coisas que, por mais que sejam úteis, você parece sempre se esquivar de utilizar; ou há coisas que você usa quase como um vício, mas que não te deixa plenamente satisfeito. São essas coisas que vão embora - e que foram, no meu caso.

Usei um feriado porque a mudança tem que ser radical; se arrumarmos aos poucos, não funcionará porque aumentamos a resistência em descartar. O ânimo em separar os itens aumenta quando olhamos para o saco de lixo e percebemos a quantidade de coisas de que não precisamos - isso nos estimula, e a resistência diminui.

Que nem fazer terapia, sabem?

Quando você percebe quantas sacas de lixo está tirando de sua casa de uma vez, você se sente compelido a continuar. O que é bom porque, ao final, não sentirá falta de nada do que está descartando. Eu, pelo menos, não estou sentindo.

Confesso que não descartei tantas roupas quanto gostaria, mas a diferença foi palpável. Posso dizer que montei um guarda-roupa cápsula com o que ficou porque tudo ficou muito mais nítido; antes, o armário parecia um mosaico de estilos porque havia acumulado roupas de diversas origens e de diversos momentos da vida; havia coisas realmente bonitas que eu não usava e ali estavam ocupando um espaço desnecessário. Além disso, como me mudei recentemente para um apartamento, o espaço era mínimo, por isso ficava bagunçado. Quando separei tudo, guardei as roupas aprovadas e logo senti a diferença no espaço, que hoje está limpo e arejado. E, olhando para o que estava pendurado ou dobrado, percebi que o conjunto compunha um estilo único, que combinava entre si. Os cabides não estavam mais apertados e ainda havia liberado uma gaveta.

Em relação aos sapatos, descartei o que era desconfortável ou que não gostava de usar.

Fui dormir com a consciência feliz e me livrei de umas quatro grandes sacas estufadas de roupa. Doei. Nem me lembro mais delas e não sinto falta de nenhuma.

No dia seguinte, animada com o sucesso, fui reunir/julgar a parte mais difícil da tarefa: os livros. Roupa e sapato, para mim, era moleza; agora, os livros sempre foram meus bens favoritos e sou muito ciumenta com eles.

Segui o mesmo método: reuni todos em cima da cama. Sim, é preciso tirar tudo da estante e reunir porque o ritual de carregá-los é parte do "tratamento KonMari"; nas mãos, eles ganham vida e são observados individualmente. O impacto da quantidade total de pertences e das pilhas "permanência x descarte" causam impacto visual e emocional. 

Manter o que nos aquece, o que nos dá alegria, o que nos preenche, é um princípio genial porque nos convida a um equilíbrio; vivemos entre o consumo excessivo e a crítica compulsória a ele, principalmente aqui na América - consumimos ou desprezamos em excesso.

Além disso, manter excesso de livros, de apostilas de curso e outros materiais de cunho produtivo, artístico ou intelectual acaba gerando um peso desnecessário e culpabilizante; você não tem que usar tudo isso porque é uma pessoa - e não um robô. Por isso, manter "o que dá alegria" é melhor que manter "o que pode ser útil"; se a gente parar para pensar, tudo é útil, mas não significa que você vá utilizar. Dessa forma, talvez o mais indicado seja manifestar gratidão por aquele bem ter nos servido e saber que deve ir embora - que "aqueles livros ficariam mais felizes se fossem relidos e amados por outra pessoa, e não encalhados na estante, intocados". Essa despedida acaba te liberando da obrigação de utilizar tudo o que você não quer realmente usar - porque, se realmente quisesse, já o teria feito.

Talvez tenhamos de entender que, muitas vezes, o prazer do consumo está mais na hora de consumir do que na coisa em si, que ficará intocada para todo o sempre.

É, Bárbara, mas eu não tenho condição financeira de ficar só consumindo pelo prazer de consumir e jogar tudo fora depois, não dá.

Eu também não, padawan, por isso apliquemos o KonMari e paremos de consumir coisas que sabemos que não usaremos depois! Se usaremos menos, consumamos menos também. :D

Descartei menos da metade dos livros, confesso. Mas descartei bastante e inclusive livros de que havia gostado, mas que, por alguma razão, não me enchiam os olhos - por exemplo, O Príncipe e o Mendigo, do Mark Twain. Foram embora também livros que nunca li e possivelmente não lerei tão cedo - e não sinto a menor falta deles.

Por muito tempo, alimentei o sonho de ter uma biblioteca particular. Hoje, não vejo muito sentido ou emoção nisso; se eu tiver uma biblioteca inteira de livros diversos, eu me sentirei em uma festa com estranhos ou em um lugar que não pertence a mim - e ainda por cima será mais estranho se eu não tiver lido todos. A verdade é que adoro livros, mas não amo todos os livros do mundo - embora os respeite e acredite que sejam a melhor invenção da nossa cultura. Gosto de visitar livrarias e bibliotecas para explorar seu conteúdo, mas prefiro um ambiente mais intimista onde moro, com uma coleção pequena de favoritos. Talvez livros tenham sido feitos para circular, afinal, e não para serem acumulados.

Acho que nossa casa e nossas coisas devam refletir quem somos, e não quem nos obrigamos a ser (e que nunca seremos).

Resultado do segundo dia: mais espaço na estante.


Na categoria "documentos", descartei uns dois sacos de papéis. Não tenho muitas apostilas, mas resolvi manter as poucas que tenho porque dizem respeito ao meu trabalho e sempre as consulto. Em compensação, me desfiz de uma penca de xerox de faculdade que guardava para ler/reler porque resolvi assumir que não os leria tão cedol; em vez de armazenar xerox, optei por manter meus cadernos de faculdade porque são caprichados, me dão uma sensação boa e são mais passíveis de releitura/consulta que os textos. Foram pilhas e mais pilhas com outras coisas velhas e muitas notinhas. No final, separei o que mantive em uma pasta de documentos, outra de contas/comprovantes, outra de contas a serem resolvidas, e mais duas de inspiração - uma contém meus desenhos, e a outra, idéias para meus livros. A parte de contas a serem pagas eu empilhei num revisteiro na vertical, como a Kondo sugeriu, e aproveitei e empilhei algumas dessas pastas também. Armazenar na vertical é sinônimo de ordem, já que pilhas horizontais nos obrigam a remover itens para alcançarmos o objeto desejado.

Montar uma categoria de "itens variados" foi a parte mais difícil porque é muito diversificada e não é esmiuçada no livro. Inseri itens de banheiro, fios eletrônicos, materiais escolares e de desenho como cadernos e lápis; foi o momento para me desfazer do material de pintura que comprei e quase não usei - embora goste dele, tive de assumir que não o utilizaria tão cedo. Quando tiver tempo, comparei outro e usarei de fato. Em compensação, mantive meus lápis de cor, que uso para colorir meus próprios desenhos, e também cadernos em branco, cuidadosamente guardados. Separei o celular velho com problema de áudio e uma calculadora científica que não usaria mais; me desfiz de um cabo que não serve para nenhum celular da casa e de muitos cremes que entulhavam o banheiro. Também me desfiz de óculos de grau velhos que não usaria novamente.

Outro tuque que a Kondo ensina é em relação a bolsas e seu conteúdo. Há pessoas que usam muitas bolsas de acordo com cor, formato e tamanho, mas não sou exatamente a sra. Bolseira; ultimamente, tenho usado duas mais básicas - uma grande e outra pequena - que escolho de acordo com o tamanho da carga a ser levada; ainda procuro a bolsa ideal que sirva para todas as ocasiões e me faça aposentar essa dupla. Enquanto isso não ocorre, revezo entre as duas, e isso causa uma inconveniência: é meio chato ter que passar itens de uma bolsa a outra, já que sempre corremos o risco de esquecer algo; por isso, o que se revelou uma ótima solução e da qual tenho sido adepta é guardar tudo o que carrego em uma cestinha. Todo dia, ao voltar para casa, esvazio o conteúdo da bolsa sobre a cama e guardo tudo na cesta; em seguida, fecho a bolsa vazia e a guardo ao lado da outra (em um canto específico para bolsas), sem entulhar o quarto. No dia seguinte,"pesco" da cesta aquilo de que preciso e guardo na outra bolsa. Prático, fácil! Evita o acúmulo de cacarecos.

Quando acabei, fechei os olhos e visualizei minhas coisas: o guarda-roupa com itens todos conhecidos e que combinam entre si; os livros na estante, classificados por cor e tema; os cadernos caprichados e pastas no escritório com documentos conhecidos. Apenas. Perguntei a mim mesma: se eu fosse me mudar agora, quantas caixas usaria? Daria pela falta de tudo? Posso enumerar de cor cada coisa que eu tenho? Fiquei feliz em responder afirmativamente. 

Resultados constatados após semanas de aplicação do método KonMari; 
  • Não sinto falta de nada que foi embora e agora utilizo melhor o que mantive. 
  • Estou há semanas sem precisar reservar um dia para arrumar a bagunça porque não há bagunça. Mesmo quando estou com pressa e realmente não dá tempo de guardar nada - o que é raro -, acabo guardando quando retorno para casa. Como tudo tem lugar fixo e em posição vertical, é fácil guardar no lugar certo e dificílimo bagunçar. É difícil, mesmo sinto que preciso fazer um esforço enorme se quiser instaurar o caos! Tudo está setorizado! Hahahah
  • Nunca fui uma compradora assídua; agora, qualquer impulso que tivesse realmente diminuiu. Desde que apliquei o KonMari, entrei em lojas e constatei: não tenho vontade de levar nada a menos que sinta real necessidade; quando olho para um objeto, visualizo onde poderia guardá-lo e quando o usaria - como percebo de antemão que não vou usar e que não me será útil, a vontade passa. Tenho uma lista sistemática do que adquirir, levando em conta o que já tenho. Para ficar claro: nem LIVROS tenho vontade de adquirir. Ok, talvez alguma vontade ainda haja, mas penso bem antes de levar algum para casa. Não há real necessidade, e não é uma força contra a qual você tem que lutar. Além disso, desfiz a famosa "lista de livros que preciso ler antes de morrer". No final, acho que não tem muita utilidade porque muitas dessas listas comportam mais o que você acha que deve ler - e não o que realmente quer ler. 
  • Parei de acumular papéis. 
  • O quarto está mais arejado e dá mais tranquilidade; virou uma espécie de templo e agora posso descansar efetivamente. A qualidade do sono melhorou.
  • Tenho uma noção mais sólida do que encaixa e do que não encaixa em minha vida. O perfeccionismo diminuiu, e acho que tenho aprendido a viver um dia de cada vez. Tenho tentado me cobrar cada vez menos e não me obrigar a ser uma pessoa multitarefas - ou me culpar por não estar fazendo algo. 
  • Tudo flui. Ter suas coisas permanentemente organizadas e minimizadas é como processar menos informação e liberar espaço no HD mental. "Minhas coisas" tornaram-se um item a menos para ser resolvido. Tudo o que tenho de resolver agora diz respeito a outros lugares, como trabalho, faculdade.
  • Tenho me sentido mais desapegada - até emprestei um livro para uma pessoa. Certo, foi para uma pessoa ALTAMENTE confiável, mas ainda é um avanço. Acho que agora valorizo minhas coisas sem aquele fardo possessivo e irracional.
  • Sinto possuir mais energia para lidar com o dia-a-dia e uma aceitação do presente. Sinto que estou mais focada no que sou, e não no que deveria ser, por isso qualquer projeto se torna mais concreto. E procuro fazer uma coisa de cada vez.

Quando falo que somos bombardeados por uma cultura de consumo, a imagem que muita gente tem é de shopping center e se sente automaticamente livre por supostamente não gostar de shopping, mas acho que meu conceito é um pouquinho mais profundo e abrange qualquer pessoa incluída no atual sistema. Viver na cultura de consumo, meus caros, é estar exposto a toda sorte de estímulos em pouquíssimo intervalo de tempo. É ver gente aparentemente mais feliz e vivendo uma vida aparentemente mais emocionante que a sua ou aparentemente sendo mega-ultra-blaster-produtiva - ver gente escalando uma montanha enquanto abre uma ONG para salvar baleias, enquanto escreve uma HQ, aprende um instrumento musical com perfeição e consegue frequentar todos os restaurantes mais badalados, além de atacar de D.J.; como temos um acesso mais rápido à informação, somos apresentados a uma noção de que não só temos direito a tudo como temos de aproveitar todos os leques de possibilidades de viver a vida, e não apenas viver o que está diante de nós. Como se não fazer infinitas coisas radicais ao mesmo tempo fosse sinal de fracasso e perda de tempo.

Tudo é mais legal e sensacional que a nossa vida. Como se ter acesso a múltiplas formas de viver nos obrigasse a ter de lançar mão de todas essas formas - viver cem vidas em uma só.

São estímulos e mais estímulos - e pessoas se lamentando ou por meio do Grande Muro das Lamentações Facebookianos ou em rodas de amigos; acreditando, no fundo, que a própria é vazia por ser uma vida normal e humana.

Por exemplo, não mantive o material de pintura, embora desejasse utilizá-lo. O problema é que, na minha lista de prioridades, tenho seis itens à frente de pintura artística. Já é difícil tentar encaixar todas essas prioridades em um projeto palpável, então pintura acaba perdendo espaço - melhor disponibilizar o material para quem de fato possa utilizá-lo. Assim, não preciso ter a incômoda visão de algo que não uso encalhado a um canto; assumo um compromisso mais sólido com minhas prioridades e ainda deixo o que não uso para alguém que tenha tempo de usar.

Acho que o KonMari transcende uma simples metodologia de arrumação e vira uma filosofia nesse sentido porque nos obriga a olhar para o que temos onde moramos e nos leva a pensar em quem somos. E entender quem somos ajuda a criar um parâmetro existencial para lidar com paradigmas contemporâneos.

6 comentários:

  1. Que máximo, Bárbara! Confesso que também sou um bocado bagunceira, e divido o meu quarto com a minha irmã. Ela é obcecada por limpeza, e a relação fica um pouquinho difícil. Além disso, mesmo que não tenha tanta grana, também sinto esse peso das coisas compradas e não usadas. Obrigada pelo incentivo! Abraços,

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    1. A quantidade de pertences pode ser absoluta, mas a sensação de peso x alívio é bem relativa, né, Ana? haha Uma coisa legal que o livro fala no começo é que, desde cedo, pessoas de nossa família (não digo que seja esse o caso) exigem que sejamos organizadas, que coloquemos tudo em ordem, mas ninguém efetivamente ensina a fazer isso.
      Abraços!

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  2. haha curioso que eu tenha lido isso agora...

    Eu divido um quarto que é pequeno demais para duas pessoas em uma casa que é pequena demais para quatro pessoas. Por isso, quando minha irmã foi viajar no dia 28 de dezembro eu quis aproveitar para arrumar meu quarto, que está além de qualquer salvação há vários anos.

    O problema é que, como o resto da minha família, eu geralmente tinha problemas sempre que tentava mexer demais em coisas empoeiradas. E, dessa vez, eu mexi pra valer. Mesmo. Resultado: no dia seguinte fui pro hospital, após uma noite de insônia, com uma crise alérgica que me derrubou. Hoje, dia 02/01/2016, ainda estou colhendo os louros indesejados da minha pequena aventura.

    Acho, agora, que pode até ser que esse livro me ajude, se e somente se:
    1 - Tiver ajuda da minha irmã;
    2 - Ambas usarem máscaras cirúrgicas;
    3 - Tiremos absolutamente tudo o que está dentro do quarto para separar o que fica e o que vai.

    Pior que a médica disse que eu não poderia mexer mais em poeira... só que meu quarto ainda está bagunçado porque no dia 28, eu tive que parar para conseguir respirar.

    =/

    Enfim, muito bom o texto :P

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    1. Nossa, Soraya!! Sua aventura é quase um romance sobre biohazard.

      Você falando isso me lembra aquele programa de organização do gnt, o "Santa Ajuda"... a apresentadora coloca alguns aparatos, luvas (não sei se põe máscara) por causa de poeira e até fungo, não é brincadeira - especialmente para quem reside no mesmo local há muito tempo. Máscaras cirúrgicas, luvas, óculos de proteção... talvez seja mesmo o caso de vocês utilizarem um aparato completo. Quase como os de um laboratório de química.

      Acho que o livro embarca na sua vibe do tudo x nada, sabe? A idéia é justamente ver o quanto você é capaz de se desapegar em pouco tempo e amenizar o acúmulo de poeira. Talvez faça bem para o coração e para os pulmões.

      Melhoras!

      E obrigada! :)

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  3. Acabei de ler o livro, coloquei em prática a organização de forma moderada (fui mais por ambientes do que por categorias, já que divido a casa com outras pessoas....). Adorei ler o seu relato, além da experiência bem completa na limpeza, seu texto é uma delícia. Parabéns! :)

    http://marianaferrari.me/

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    1. Obrigada, Mari, fico muito feliz com esse seu comentário! De verdade. ^^

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