segunda-feira, 10 de fevereiro de 2014

Para Além do Ser (Desafio #3)



Nota sobre o desafio: você termina de ler um livro maravilhoso. Então pega o próximo, na depressão pós-livro, e logo se surpreende por ele ser tão bom quanto o anterior.

E sim, estou muuuuito atrasada com os posts sobre o Desafio. :[

Bem, os dois livros anteriores, que me serviram de pontapé inicial, são clássicos - um do século XIX, e outro, do século XX; o deste post, o terceiro, é muito atual, e também especial.

Porque eu conheço a autora, e tenho uma grande afeição por ela. :3

Esse livro foi lançado no dia 30 de novembro de 2013, na Leitura do BH Shopping. O autor é Carmem Farage, psicanalista, acupuntura e autora de uma técnica que muito a tem auxiliado no mundo terapêutico.




Capa da primeira tiragem. 


Espiritualidade


É meio duro falar de espiritualidade quando se tem apenas 23 anos. Sei lá, eu associo muito a juventude, principalmente a nossa, com a distância da morte, associo a uma liberdade sem par e a um pensamento racionalista que vem para quebrar com o moralismo até então vigente, e tudo isso é ótimo. Mas é porque temos essa vitalidade e esses costumes liberais que me sinto um pouco deslocada quando falo em espiritualidade, porque as pessoas já vêm falando em religião (com preconceitos e estereótipos) ou mesmo em espiritismo kardecista (que não é a "minha" doutrina, embora eu tenha nascido nela). Existe todo um rótulo e um atestado de "isso é desnecessário" quando alguém sem rugas ou fios brancos vem falar de essência espiritualista.

Ou é doideira minha?

Eu tenho estado em rodas jovens muito receptivas a esses aspectos espirituais, mas, bem eu estudo psicologia, então rola muito esse negócio de espírito e autoconhecimento. :D

A verdade é que eu  mesma sou tão cética, racional, e tenho uma espiritualidade tão própria que as pessoas me tomam facilmente por atéia (o que considero um elogio, embora não tenha que necessariamente ser), e como essa minha espiritualidade é muito íntima e difícil de verbalizar, não faço muita questão de expô-la. Simplesmente acho que cada um tem a sua, sabem?

Mas como esse é um post de um livro espiritualista, eu vou falar um pouco da minha, correndo o risco de me trair em definições tão limitadas:

Eu acredito sim em um "deus", mas é mais um deus dos agnósticos - talvez, não sei, talvez nem isso. Na verdade, "acreditar" não é o verbo correto. Eu sei (obrigada, Jung) de um deus desconhecido, um "algo", desprovido de vícios humanos, uma essência que representa uma perfeição inimaginável e incompreensível. Mas que todos somos parte dela, todos temos esse "deus" interior, essa essência de sabedoria, e quanto nos conectamos à nossa própria sabedoria, nós nos conectamos a essa sabedoria maior. Ela está em nós. É o que temos de melhor, de mais profundo, de mais fantástico. Ela não se preocupa se você mentiu hoje para a sua tia, ou se você saiu com uma roupa muito curta, ou se você expressa uma determinada orientação sexual - tem coisa mais humana, mais mundana, que achar que esse tipo de coisa é preocupação divina? Essa figura é meio distante do conceito paternal de muitas divindades religiosas, porque ela não seria um pai que falta, ela só... é. Não é algo que eu procure como se procurasse a um pai perdido, porque eu estou aqui, eu preciso me vencer, vencer tudo, superar meus obstáculos e, como ninguém pode fazer isso por mim, procuro apoio de amigos mas, para realmente fazer o que tenho de fazer, resta-me apenas me conectar à minha sabedoria interior, ao "deus que me habita". Ninguém pode viver por mim, certo?

No meio do caminho, existiriam amigos aqui na matéria e lá no mundo espiritual, em várias dimensões e em várias freqüências, todos sendo um pouco dessa essência criadora, na qual não penso simplesmente porque não compreendo. Mas eu penso em meus amigos - aqui e lá. E eles eu compreendo, e eles estão comigo. E eu estou com eles, ajudando-os também, mas sem viver por eles também.

E sim, eu acredito em "vida após a morte", uma "sabedoria criadora", mas isso não tem que ter nenhuma conotação religiosa. Eu não sou adepta a rituais e nem procuro santuários para me conectar porque eu sou essa sabedoria ambulante, e realmente preciso dela todo o tempo então, ahn, não rola de parar o que estou fazendo em um momento de decisão e caçar um lugar para cumprir um ritual. Acho que o grande ritual é a vida. 

E é por isso que estamos aqui.

Como esse é um saber (e não uma "crença") muito meu, que me traz uma segurança ancestral, "mais velha do que a própria vida" (linda expressão roubada de "Jogos Vorazes"), eu não sinto necessidade de dizê-la a todo momento. Eu não discuto com ninguém sobre, eu não falo. Só sinto, só é. Para mim.

Normalmente, eu não utilizo imagens para me apoiar, dificilmente concretizo essas coisas. Não recorro a rituais, minha meditação é minimalista. Não sou de usar nomes ao convocar amigos "sutis". Essas coisas são mais um processo interno, sem manifestação.

Para mim, espiritualidade é isso. É você sair do mundo externo, sair da matéria, e procurar nos sentimentos mais profundos uma sabedoria que traz paz. Serenidade. E então você a leva para o mundo.

Por que você acredita em uma essência criadora, Bárbara? Seus valores, sua ética, não te sustentam no mundo? Não são suficientes?

Então... é que, para mim, os meus valores, os mais altruístas, os mais sábios, os mais humildes, os mais corajosos, equilibrados, representam a essência criadora. Não é uma necessidade de crer, é uma inversão de conceito; do tipo "se eu posso pensar em algo tão bom quanto um caminho de retidão, de amor, então existe essa forma mais pura, que é a que eu encontro quando escolho esse caminho. É como se o fato de eu ter valores fosse a indicação da existência de um valor maior, distante, incompreensível, que está em todos nós e que representa a todos nós, em diferentes interpretações, mas em um conceito distante de perfeição que nenhum de nós realmente compreende".

E, agora que expus meu ponto de vista, vamos ao livro!


A História


O livro se chama "Para Além do Ser - A Cura Quântica". Nesse livro, a autora discorre a respeito de sua história como psicanalista talentosa e disciplinada, que viveu toda a vida com o consultório cheio - mudou-se tantas e tantas vezes de local, de cidade, e até de país!, mas seu consultório nunca deixou de encher. Determinada e conhecedora de sua área, manteve uma disciplina hercúlea e até budista em seus anos de profissão, sempre atendendo pontualmente e de forma solícita às necessidades de seus pacientes e firmando normas simples e esclarecedoras em seu cotidiano, para que sua vida profissional se mantivesse estruturada.

Durante quinze anos, exerceu a psicanálise tradicional, até imergir quase que por acidente no mundo da espiritualidade. Era muito cética e ignorava esses mundos sutis - então, certo dia, buscou-os.

Desde então, a autora estudou muitas teorias transpessoais e formas terapêuticas, entrando em contato com a técnica de regressão de memória a vidas passadas do Dr. Brian Weiss, um psiquiatra e neurologista estadunidense que reformulou sua forma de ver o mundo ao lidar com o peculiar caso da paciente que regredira a vidas passadas e assim reformulara a vida atual.

O livro fala dessa técnica e seu embasamento com uma linguagem fluida, transmitindo conhecimentos espiritualizados desatrelados de circuitos religiosos e enxergando com otimismo a vida humana e os processos pelos quais passamos.

Em suma, sua técnica, conhecida como Terapia Lumni (de "coluna", em latim), baseia-se no princípio da reencarnação, que foi e é abordado de tantas formas em tantas doutrinas. Segundo esse princípio, estamos sujeitos a constantes traumas e tentativas de resolução na roda encarnatória, e quanto menos buscamos a resolução para esses problemas, mais nos prendemos a um novelo de lã. É mais ou menos assim: ao longo de séculos, reencarnamos de diversas formas e tivemos diversas relações com o mundo; dependendo da forma como agimos e dos erros que cometemos, acabamos gerando "dívidas" com pessoas a quem fizemos mal e circunstâncias que nos trazem medo, dor, culpa e arrependimento. Esse constante sofrimento humano baseado em situações de vítima, agressor e testemunha geram em nós negócios inacabados e traumas constantes e incompreensíveis, especialmente por estarmos em um plano tão denso e suscetíveis ao esquecimento do passado.

Uma vez inseridos na roda-viva tridimensional da Terra, embolamo-nos ainda mais com as paixões e outras necessidades terrenas, que podem nos ajudar ou nos atrapalhar ainda mais. Quanto mais mundanos e inconscientes de nós nos tornamos, mais materialistas, ignorantes e suscetíveis ao sofrimento nos encontramos. Quando nos refugiamos da dor e do sofrimento de forma material, sem olhar para o problema real, nos afundamos em mais angústia e mais sofrimento, porque nos prendemos ao mundo material e não damos um significado ao que sentimos.

Então comemos demais.

Dormimos demais.

Compramos demais.

Consumimos demais, consumimos tudo.

E nos apaixonamos, e nos tornamos obcecados por paixões mundanas, sentimentos vazios e tentativas fúteis de aplacar o que é mais profundo e essencial que esse mundo material. Nós nos enchemos de caprichos e mergulhamos em nossa própria ilusão.

A teoria na qual a Lumni se baseia, bem como a forma de tratamento criada pela autora, é a de que muitos de nossos problemas não se originam apenas em nossa vivência atual, como o nascimento e a educação, e que a origem é mais profunda; essa origem se entrelaça com os problemas atuais, andando ora de mãos dadas, ora em relação de causa e efeito. De repente, não é apenas o problema físico ou a criação o que atrapalha uma pessoa, mas também o lado espiritual - os problemas que geraram "carmas", os espíritos obsessores que tornam tudo pior, os traumas adquiridos em outra vida que se manifestam por medo e culpa. Não há necessidade de apontar este ou aquele elemento como principal causador porque a idéia é ver tudo interligado e tratar tudo em conjunto, dando atenção a todos os aspectos separadamente.

Assim, a terapia consiste em tratamentos energéticos de origem antiga (como Reiki), desobsessão espiritual e, é claro, na própria regressão. Essa regressão é feita quando se relaxa uma pessoa até permitir que ela veja as imagens que afloram de seu inconsciente, construindo uma história que tem tudo a ver com a situação atual dela.

Ao longo do livro, Carmem dá exemplos de diversas situações que ocorreram em seus anos de prática, diversificando as questões acerca de reencarnação e tratamento e transmitindo uma visão ampla da coisa. A Terapia Lumni rompe limites, permitindo a ascensão do estado de ignorância em que nos encontramos.

E por que "a cura quântica"? Ela também explica isso no livro. Basicamente, como a idéia é romper paradigmas, a Lumni rompe com a visão linear do tempo; em regressão, é possível conversar com seus diversos "eus", acessar o futuro mais "próximo", tudo para encontrar resoluções para si mesmo. A consciência de quem você foi é fundamental para a compreensão de quem você se tornou, e encontrar a si mesmo é uma forma de se tornar uma pessoa renovada. Não existem limites na teoria Lumni: acessa-se passado, futuro, diversos planos e seres de todos os tipos. A definição de extraterrestre não é mais a de um E.T. verde de olhos grandes, e sim uma oportunidade de pensar em incontáveis seres que jamais habitaram a Terra e povoam diversos lugares e planos, vivendo de forma sutil ou até mais densa.

Particularmente, o céu, que me sempre me desperta emoções quando o contemplo, não é esse toldo "estacionário" com estrelas explodindo a milhões de anos-luz de distância; para mim, existe um trânsito multidimensional que somos incapazes de enxergar, repleto de formas de vidas desconhecidas que não vão "entrar em contato conosco" simplesmente porque o universo é vida, e ver humanos num planeta chamado Terra para muitos é como eu ver formigas caminhando na parede do quarto enquanto escrevo esse post.

Naturalmente, vocês não verão, no livro, uma pessoa formada em Física Moderna falando de partículas de matéria. Então, por que se apropriar do termo "quântica"? Receio que a ciência e o holismo não poderiam encontrar pessoa com mais responsabilidade para usá-lo. Porque não, o livro não é sobre teorias científicas de física, não é sobre aquilo que a "peneira humana" consegue ver. A ciência foi o elemento responsável pela construção do mundo atual e é a aquisição de conhecimento em sua forma mais filtrada, racional e meticulosa que a humanidade já criou, mas esse livro e essa história não pretendem passar pelo crivo científico para existirem. Pelo menos, não por ora, embora seja possível que ainda passe, principalmente como modalidade terapêutica.

Em outras palavras, não é porque não é um tratado sobre Teoria das Cordas que o termo "quântico" sugere enrolação - isso seria um preconceito que atiraria algo tão complexo e belo no ralo devido a uma visão muito fechada a respeito da vida. A Lumni segue critérios estruturados e tem uma base antiga e diversificada.

A Terapia Lumni funciona e possui um efeito relativamente rápido e intenso.


Espiritual x Material


"Então qual é a da Terapia Lumni? Eu não posso querer ter um Iphone, um sapato de 200 reais, um PlayStation 4, uma viagem para a Disney? Agora isso é errado?"

É claro que não é disso que o livro fala, e nem a espiritualidade em si. A idéia de se espiritualizar não é parar de comprar coisas, comer doces gostosos, beber cerveja, sair com amigos, ir para balada, etc. A idéia é, pura e simplesmente, dar um significado interno à existência. É possível perceber que não é o corpo sensual que você possui, a maquiagem que você utiliza, as roupas que você compra, o carro que você obtém, a casa que você tem (e enche de mobília), a quantidade de amigos adicionados no facebook ou o pudim que você pode comprar os elementos responsáveis por dar sentido à sua existência porque, se eles forem, você provavelmente não é saudável ou feliz. Essas coisas são apenas a casca, são apenas objetos de que você lança mão em sua passagem efêmera pelo ciclo da vida - e não devem ser a causa de uma vivência plena. Até podem, mas representam uma causa vazia.

"Quem é você para me dizer que é ou não vazio?"

Ninguém, eu diria. Mas eu percebo que me nutrir de pensamentos positivos, esperança, amor próprio e amor por outras pessoas é muito melhor do que encontrar o sentido da vida em um punhado de batatas fritas.

Eu amo batatas fritas.


"Comida não é amor." - sabedoria de Roger em "Friends". Uma homenagem para quem riu muito dessa cena! :D

E isso é algo que dá pra sentir. A idéia não é você deixar de ambicionar bens materiais, e sim entender quando extrapola. E, quando não extrapola, adquiri-los consciente de que são apenas objetos, meios que você utiliza na vida, e não coisas para se amar.

A gente fica tão preso em picuinhas, desinteligências e vícios (grandes e pequenos) que não nos escutamos, não ouvimos nossas reais necessidades.

Julgamos desde o corte de cabelo da vizinha a supremos atos governamentais de países afora. Julgamos culturas diferentes, pensamentos diferentes, tudo o que é diferente do nosso universo umbigo. Não gostamos quando discordam de nós.

Somos grosseiros pensando que é apenas sinceridade.

Vivemos o cotidiano de um alcoólatra pensando que isso é, sei lá, apenas beber socialmente.

Enchemo-nos de neuras ou de irresponsabilidades, culpamos muito os outros ou apenas a nós mesmos. Vivemos de faltas e excessos, e às vezes como se nada estivesse errado.

Não que seja errado, mas a mudança existe. Não é uma promessa, é uma possibilidade.

E só você pode dizer o quanto necessita dessa possibilidade e o quanto você se desviou de você mesmo.

Então, o livro...


Eu não poderia ter ficado menos satisfeita com essa perspectiva desprovida de "ismos" de "Para Além do Ser", porque está perfeitamente dentro do que vejo, na liberdade que eu vejo, na ausência de julgamento que eu vejo. Fico muito feliz de ter conhecido alguém tão cético e aspirante pela liberdade espiritual como Carmem Farage, que trilhou um caminho de descobertas e desventuras para chegar a uma técnica toda dela, com sua assinatura.

Basicamente, é isso: da forma como se lembra do que comeu no café da manhã, você pode acessar imagens que pode até dizer que são da sua imaginação, mas que não necessariamente sejam - o que já diz muito sobre você. E isso é terapêutico. E atinge um nível muito sutil.

Eu recomendo? Recomendo.

Por quê?

Porque é uma proposta otimista e libertadora. Porque significa esperança. Porque fala da esperança em algo que funciona, que já trouxe resultados. Porque conta histórias relacionadas a uma visão de mundo que só se amplia e só se despe mais e mais de preconceitos.

E isso é lindo!

A Terapia Lumni


Carmem me ensinou essa técnica e hoje sou Terapeuta Lumni - e integro uma equipe dessa modalidade. Segundo o que a própria Carmem diz, "é uma técnica simples, mas transformadora". Eu vi algumas coisas que o livro relata. Presenciei. Então não, esse não é apenas um livro que li, mas um livro de algo que eu comecei a vivenciar também.

Só que ainda estou no começo dessa jornada, então não sou tão experiente quanto a autora. Mas, se tem uma coisa que me deixou firme nesse caminho, apesar de eu tremer violentamente nas bases em alguns instantes, foi como minha mente se formou e se preparou nas últimas duas décadas, chegando a estar "pronta" para receber esse tipo de ensinamento. Eu posso não ser tão experiente, mas sou muito firme nesses conceitos, embora não o suficiente para perder a flexibilidade de saber quando mudar.

São esses conceitos que me mantêm aqui. E essa coisa de gostar de ver tudo de uma forma um pouco mais ampla e de enxergar mundos inteiros em detalhes. E me despir ao máximo dos valores fechados, perenes da vida adulta, ter discernimento para isso.

Basicamente, é um jeito de enxergar a vida. Com uma esperança desprovida de ilusões.

E também um jeito de mudá-la.

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