domingo, 30 de agosto de 2015

Long grey hair!


Linda Rodin, maravilhosamente fotografada pelo blog Advanced Style!
























Algumas pessoas acharão mórbido, mas um dos meus devaneios consiste em imaginar a passagem de tempo no rosto e nas mãos das pessoas. De vez em quando, pego-me olhando para o rosto de alguém e imaginando essa face mais jovem ou mais velha. Esse hábito de observar rostos humanos surgiu da prática de reproduzi-los de forma realista no papel.

É que o desenho, principalmente em versão realista, consiste em você decompor a imagem a ser copiada; um rosto, quando desenhado, não é percebido pelo seu todo, mas visualmente decomposto nas centenas de tonalidades que o constitui, em um complexo jogo de luz e sombras - e é a atenção a esses matizes que torna, afinal, o desenho reconhecível, fiel ao real. De tanto prestar atenção nesses detalhes, peguei essa mania de observar os rostos das pessoas.

Filhinha de uma cultura hollywoodiana, sempre estive acostumada à representação da passagem do tempo pela forma "cinematográfica", ou seja: uma mesma personagem, em idades distintas, sendo interpretada por diferentes atores - por isso, durante a infãncia, eu tinha a impressão de que, quando você envelhecia, você literalmente se transformava em alguém completamente diferente. Quando cresci, finalmente percebi que, na realidade, o seu "eu idoso" é mais fisicamente (e emocionalmente haha) parecido com o seu "eu adulto" e infantil do que o cinema é capaz de transmitir; provavelmente, uma das poucas exceções que mostra o envelhecimento realista é Boyhood, que ainda pretendo ver. Aliás, sobre Boyhood: sempre pensei em rodar um filme EXATAMENTE ASSIM, e tenho certeza de que muitos de vocês já tiveram a mesma idéia - finalmente alguém foi lá e fez! Parabéns, Richard Linklater!

Bom, vendo retratos de parentes e observando pessoas, percebi como é o envelhecimento real. E fiquei com essa mania de olhar para uma pessoa e imaginá-la quando criança e quando velha. Ou, quando vejo um bebê de um ano, olho para ele (e para os pais) e imediatamente imagino como ele será - em aparência e modos - aos dez anos! Ou então como será aos catorze, a cabeça cheia de pensamentos adolescentes e os trejeitos totalmente diferentes daquela criatura com cara de pão que vivia no colo das pessoas.

A partir de como vivo cotidianamente, tento imaginar onde aparecerão meus principais vincos pelas expressões faciais que mais utilizo. Sou uma pessoa muito ansiosa e analítica, então já imagino as marcas de expressão na testa de tanto franzi-la ou de arregalar os olhos. Já os vincos ao redor dos lábios, que algumas pessoas possuem, não serão tão marcantes em mim. Imagino a consistência dos fios do cabelo e até mesmo (cruzes!) se desenvolverei alguma doença física!

Se eu continuar com meu padrão de vida, meus hábitos e meus pensamentos - e atitudes - que tipo de doença poderei desenvolver? Pensar nisso é também uma forma de se conhecer e de evitar o surgimento delas.

Deixando de lado essas excursões à batatinha, acrescento aqui como a expectativa cultural é cruel com as mulheres quando o assunto é envelhecer. O envelhecimento já é algo considerado pesado e triste para nosso Admirável Mundo Novo - quando levamos essa temática para esse gênero, a coisa se torna particularmente dramática. É como se mulheres simplesmente não pudessem dar continuidade ao curso natural da vida, e acabam por internalizar essa idéia de mil maneiras. Começam a pintar o cabelo com mais afinco e a arrancar compulsivamente os fios brancos, a carregar na maquiagem com aqueles cílios postiços esquisitos, a trying so hard para não assumir a idade. Lutam não para ficar só "apresentáveis", mas para parecerem mais jovens do que realmente são - e, quando não o conseguem, escondem-se porque envelhecer é "feio". Perguntar a idade de uma mulher tornou-se "falta de educação", como se fosse ofensivo lembrar que ela vivenciou mais um ciclo solar. O envelhecimento é pensado em perdas - jamais em ganhos -, e a sabedoria tornou-se a única unidade de troca dessa faixa etária.

Mesmo diante do aumento da longevidade, a expectativa de vida continuou efêmera, pois a vida, para muitos, se resume à juventude - então, paradoxalmente, os anos "válidos" diminuem.

E, junto a essa anulação de uma parcela da vida que tem aumentado, há agora uma valorização das "Lolitas". Ser uma mulher de vinte anos já é estar dentro de tudo o que é socialmente desejável, mas o grande símbolo de saúde e de auge da beleza hoje reside em meninas de doze que ainda nem sabem resolver uma equação de segundo grau.

[Podem falar que saber ou não resolver uma equação de segundo grau não tem relação alguma com beleza física, mas, ei, vivemos em uma cultura que relaciona beleza ao tamanho dos glúteos - pseudodarwinianos podem discursar à vontade, mas relacionar ideal de beleza a glúteos é tão aleatório e precipitado quanto relacioná-lo com o conhecimento da fórmula de Bhaskara. Think about it.]

Essa síndrome de Lolita. Eu ainda não li o livro, mas pretendo - e me deixa com um pé atrás a coisa que mais parece uma romantização da pedofilia.

É meio doentia essa idolatria a uma juventude quase infantil e irrealmente perene enquanto, à terceira idade - que, em uma sociedade que alcança os oitenta anos facilmente, corresponde a quase cinqüenta por cento da vida -, delegamos o refugo da miséria humana.

Como uma pessoa introvertida que realiza freqüentes peregrinações à Lua e promove campeonatos de patinação nos anéis de Saturno, decidi que não queria fazer parte desse ponto de vista vazio e sem noção e que envelheceria com saúde (física e mental) e entusiasmo, aproveitando cada momento. Talvez essa minha mania de enxergar a velhice no rosto das pessoas soe melancólica, mas a idéia que faço da minha terceira idade foge dessa melancolia graças aos recursos materiais e psicológicos de que dispomos hoje.

Além disso, do ponto de vista ideológico, apareceu esse movimento "contracorrente" de valorização e embelezamento das diversas etapas da vida - inclusive da velhice. Estamos em um período de reeducar nosso olhar e de criticar conceitos e papéis pré-estabelecidos. Em outras palavras, o envelhecimento tem recebido uma atenção positiva e passou a ser incorporado à vivência.

Há, afinal esperança para a humanidade. E ela é a última que morre.

Quando eu estava fuçando sem grandes pretensões no Pinterest, deparei-me com a foto de uma mulher de longos cabelos cinzentos. De uns tempos para cá, tenho achado lindo, e o post de hoje é uma inspiração aos grandes feitos da mãe natureza. Longe de mim impor a todas esse padrão de long grey hair, mas estou reservando este espaço bloguístico para fazer um ode a esse visual; um ode diante de tantas tentativas de esconder a idade que vejo por aí; tanta vergonha dos fios brancos, idas sistemáticas ao salão e medos arraigados da raiz branca que, no final, sempre leva a melhor.

Quero realmente ser o Ignotus Peverell, que reconhece na Morte uma amiga - e no envelhecimento uma aliada. E não quero morrer de vergonha da raiz branca e correr para o salão fazer aquelas luzes pra lá de bizarras.

A visão que tenho da Bárbara de sessenta anos é a de uma mulher mais serena e cosmopolita, de personalidade franca, forte e crítica e de cabelos compridos e cinzentos, como uma bruxa - e isso, para mim, é pura qualidade de vida.

Pois bem: olhem que lindas essas cabeleiras brancas, gente! <3








4 comentários:

  1. Sabe que eu já vi várias pessoas com o cabelo dessa cor? No começo achava estranho, mas agora me acostumei!
    Beijos

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    1. É bem uma questão de hábito, né, Patricia? A gente acaba reeducando o olhar sem perceber, é bem interessante! :D Beijos

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  2. Oh, Bárbara, eu estou encantada por seu texto doce. Que palavras lindas! Parabéns por tecê-las tão bem!
    O movimento Ageless é um dos que mais me entusiasmam no mundo da moda. Por favor, assista o Advanced Style! Está na Netflix. É muito, muito inspirador, e a relação destas mulheres com a moda é tocante, Esta mulher da sua imagem em destaque já foi fotografada pelo blog Advanced Style também, e ela tem um guarda roupa cheio de tesouros. Vou olahr a minah Elle quando chegar em casa e te conto mais!

    Abraços e quero voltar várias vezes aqui!

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    1. Oi, Ana!! Seja bem-vinda! Fiquei muito feliz com suas palavras, muito obrigada!! :)
      É sempre tão bom ter um retorno, e é uma surpresa agradável demais quando vem com tanta gentileza!

      Eu vi o Advanced Style!!! Ótima dica, por sinal. é encantador esse projeto - e virei fã dessa moça, a Linda e fiquei babando nas fotos dela que estão pela net. Ela é muito diva.
      A idéia do Ari (Seth Cohen) foi simplesmente genial. É bem o tipo de coisa que faz a gente pensar "precisamos de mais gente com essas idéias". Que nem quem está por trás de Humans of New York!

      Fique à vontade para voltar, adorei suas dicas!

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